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O SIGNIFICADO DE MISERICÓRDIA NA BÍBLIA

Foto: pixabay

A palavra Misericórdia tem origem latina, e é formada pela junção de miserere “ter compaixão”, e cordis “coração”. “Ter compaixão de coração”, significa ter a capacidade de sentir aquilo que a outra pessoa sente; aproximar seus sentimentos dos sentimentos de alguém; ser solidário com as pessoas. Portanto, a Misericórdia é um sentimento de compaixão, despertado pela desgraça ou pela miséria alheia. Esse sentimento de ser misericordioso é atribuído a Deus nas diferentes religiões, incluindo o Cristianismo, o judaísmo e também no Islamismo.


NO ANTIGO TESTAMENTO

No Antigo Testamento as palavras que falam de Misericórdia são: Hesed e Rahªmim.


Hesed, que significa favor não merecido, afabilidade, benevolência e denota graça divina e Misericórdia. O termo em hebraico “hesed”, também indica uma profunda atitude de «bondade». Quando esta disposição se estabelece entre duas pessoas, estas passam a ser, não apenas benévolas uma para com a outra, mas também reciprocamente fiéis por força de um compromisso interior.


Hesed, expressa um presente imerecido e inesperado de graça divina que vai além de todas as expectativas e categorias humanas. A Misericórdia é, sem dúvida, a qualidade predominante de Deus para com o ser humano (Ex 34, 6, Sl 86, 15). Com o povo de Israel, Deus é compassivo, paciente e tolerante, ao ponto em que todo o bem que acontece com o ser humano é o resultado de Misericórdia de Deus, que se estende a todos (Jn 4,1-11) e dura para sempre (Sl 136).


Quando no Antigo Testamento o vocábulo hesed é referido ao Senhor, acontece sempre em relação com a aliança que Deus fez com Israel. Esta aliança foi da parte de Deus um dom e uma graça para Israel. Contudo, uma vez que Deus, em coerência com a Aliança estabelecida, tinha-se comprometido a respeitá-la, hesed adquiria, em certo sentido, um conteúdo legal. O compromisso “jurídico” da parte de Deus, deixava de obrigar quando Israel infringia a aliança e não respeitava as condições da mesma. E era precisamente então que hesed, deixando de ser uma obrigação jurídica, revelava o seu aspecto mais profundo: tornava-se manifesto aquilo que fora ao princípio, ou seja, amor que doa, amor mais potente do que a traição, graça mais forte do que o pecado.


Rahªmim o matiz do seu significado é um pouco diverso do significado de hesed. Enquanto hesed acentua as características da fidelidade para consigo mesmo e da “responsabilidade pelo próprio amor”; rahªmim denota o amor da mãe (rehem= seio materno). Do vínculo mais profundo e originário da unidade que liga a mãe ao filho, brota uma particular relação com ele, um amor particular. Deste amor pode-se dizer que é totalmente gratuito, não fruto de merecimento, e que, sob este aspecto, constitui uma necessidade interior: é uma exigência do coração. Sobre este fundo psicológico, rahªmim dá origem a uma gama de sentimentos, entre os quais a bondade, a ternura, a paciência e a compreensão, florescem como prontidão para perdoar.


Convém contextualizar o termo hesed à família de palavras em hebraico que remete a três raízes: hânan, râham e hâsad. Os significados destes três termos no Antigo Testamento convergem para a tradução como “Misericórdia”, mas devido a riqueza e complexidade semântica aparecem, dependendo do contexto e tradução como bondade, benignidade, solidariedade, graça, lealdade...


Assim, começando pelo livro do Êxodo: “O Senhor, o Senhor, o Deus compassivo e clemente, paciente, misericordioso e fiel, que conserva a Misericórdia até a milésima geração…” (Ex 34, 6-7a).


Passando por Oséias, pelo capítulo 16 de Ezequiel, o Cântico dos Cânticos, o livro da Consolação (Is 54, 5-10 e Is 62, 4-5) “Tua terra será chamada desposada. Assim teu criador te desposará, assim encontrará em ti sua alegria”. Misericórdia que encontra na amorosa mãe uma imagem – como no capítulo 11 do livro de Oséias: “Israel era ainda criança, e já eu o amava”; ou no capítulo 49 de Isaías: ”O Senhor chamou-me desde o meu nascimento; ainda no seio de minha mãe, Ele pronunciou o meu nome”; Is 49, 15: Mesmo que uma mãe se esquece-se do seu filho, nunca me esquecerei de ti. Is 66: “Sereis carregados no colo e acariciados no regaço”.


Na Misericórdia do Senhor para com os seus, manifestam-se todos os matizes do amor: Deus é para eles Pai (Is 63,16), dado que Israel é seu filho primogênito (Ex 4, 22); ele é também o esposo daquela a quem o Profeta anuncia um nome novo: “bem amada” (ruhama), porque será usada Misericórdia para com ela (Os 2,3). Mesmo quando o Senhor, exasperado pela infidelidade do seu povo, decide acabar com ele, são ainda a compaixão e o amor generoso para com os seus que o levam a superar a sua indignação (Os 11,7-9).


E então, torna-se fácil compreender a razão pela qual os salmistas, ao quererem cantar ao Senhor os mais sublimes louvores, entoarão hinos ao Deus do amor, da compaixão, da Misericórdia e da fidelidade (Sl 103). De tudo isso se deduz que a Misericórdia, além de fazer parte de Deus, é algo que caracteriza a vida de todo o povo de Israel e de cada um dos seus filhos e filhas: é o conteúdo da intimidade com o seu Senhor, o conteúdo do seu diálogo com Ele. Precisamente sob este aspecto, a Misericórdia é apresentada em cada um dos Livros do Antigo Testamento com uma grande riqueza de expressões.


Deste modo, a Misericórdia se contrapõe, em certo sentido, à justiça divina; e revela-se em muitos casos, não só mais potente, mas também mais profunda do que ela. Já no Antigo Testamento se ensina que, embora a justiça no homem seja autêntica virtude e em Deus signifique a perfeição transcendente, contudo o amor é “maior” do que a mesma justiça; e é maior no sentido de que, relativamente a ela, é primário e fundamental.

A Misericórdia motiva a prece e fundamenta a confiança do povo de Israel. Adia o castigo, mitiga-o e até mesmo o suspende, e triunfa libertando o necessitado. A Misericórdia é o arco extremo que abrange todas as etapas históricas e estabelece a última: porque a Misericórdia de Deus torna a conversão possível e a transformação do homem real.


NO NOVO TESTAMENTO

O termo Misericórdia no Novo Testamento é identificado com o substantivo grego “eleos”. Também é definido com o verbo grego “eleao”. Tanto o substantivo como o verbo significam o sentimento que é experimentado no infortúnio que aflige a outra pessoa e a ação que decorre desse sentimento. Portanto, a Misericórdia de Deus no Novo Testamento se revela como um amor compassivo que vai onde há sofrimento e cura todo tipo de males, mas também revela que é um Deus que perdoa, reconcilia e regenera o homem. Jesus dá mostras constantes dessa Misericórdia em sentimento e em obras: à multidão (Mc 6,34) aos doentes (Mt 14,4), à viúva (Lc 7,13). Também revela o perfil do Pai como sendo um Deus rico em Misericórdia (Lc 15,20).


O verbo “eleein”, no sentido de ter compaixão, ajuda compassiva, piedade, aparece nos sinópticos nas histórias sobre eventos que destacam a irrupção da Misericórdia divina em desgraças humanas (Mc 5,19, 10,47,48: Mt 20,30,31 e Lc 18,38,39). Existe o termo em consonância com a “yess” hebraica (bondade), no Antigo Testamento, que é o comportamento que Deus exige que uma pessoa observe com outra (Lc 10, 25-37). Em Mateus 5,7; 18, 33, o verbo ”eleeo”, expressa a Misericórdia que uma pessoa deve sentir em relação a outra.


Os evangelhos falam sobre a vida de Jesus, uma vida desenvolvida sob o signo da Misericórdia de Deus que intervém na história da humanidade. A vida de Jesus é a cumprimento da promessa e da salvação (Mt 1,22), no contexto de uma história de Compaixão de Deus pela humanidade (Lc 1,50-78). Jesus anuncia Misericórdia por onde anda, pois Ele é a Misericórdia de Deus que se faz presente no meio do seu povo. Isso é a grande verdade que os evangelhos anunciam. Em Marcos e Lucas, essa Misericórdia é expressada pelo anúncio do reinado de Deus que faz Jesus (Mc 1,1,14). Esta enunciação realizada com sinais que restabelecem a dignidade das pessoas e eles mostram que Jesus veio para “Anunciar as boas novas aos pobres e proclamar o ano da graça do Senhor” (Lc 4, 18-21).


Jesus não só cura os doentes (Mc 2,17; Lc 5:21), também restaura dignidade dos que são excluídos, por não cumprir com o Parâmetros morais ou religiosos, em seu tempo, e oferece reconciliação aos necessitados de perdão e compreensão. Isto é demonstrado pela sua atitude cheia de indulgência e favor dos pecadores, que acham nele um “amigo” (Lc 5,34), que não tem dúvidas sobre seu coração, apesar das dúvidas de muitos, chegando até mesmo sentar-se em sua mesa (Lc 5,27-32; 7,36-50; 15,1-2; 19,1-10).


Por outro lado, Jesus procura com suas palavras comunicar claramente o significado da Misericórdia de Deus, especialmente através de parábolas que as pessoas entendem. As chamadas parábolas da Misericórdia (Lc 15,3-20) diz Jesus para justificar sua compaixão e condescendência com publicanos e pecadores (Lc 15,1-2). As duas primeiras, a da ovelha perdida e o do Dracma que perdeu (15,3-10), são analogias da alegria que causa a conversão no céu, mesmo que seja apenas um pecador. Para Jesus, aqueles que não merecem Misericórdia, de acordo com os fariseus, são comparáveis à ovelha ou ao dracma perdido e encontrado.


A terceira mostra como um Filho pródigo e libertino está, ansiosamente, aguardado pelo seu próprio pai, que aguarda seu retorno e que, quando visto de longe, o reconhece, enche seu coração de compaixão e corre para abraçá-lo (Lc 15, 11-32). É a imagem mais vívida do amor ilimitado do Pai celestial. Jesus revela que Deus não mantém a ira contra ele pecador, mas espera pacientemente por sua volta para casa com os braços abertos. Esta imagem ocupa o centro da mensagem de Jesus sobre Deus. Para Jesus, Deus é Pai, porque apenas o amor de pai ou mãe podem explicar o amor incondicional e gratuito de Deus.


O apóstolo Paulo apresenta Jesus Cristo como rosto da Misericórdia divina: Cristo, tendo feito tudo semelhante aos irmãos e tendo experimentado em sua própria carne a dureza do sofrimento humanos (Hb 2,17-18), é “Imagem de Deus invisível, primogênito de toda a criação” (Cl 1,15; cf 2 Cr 4: 4), o Filho o unigênito do Pai, o “reflexo de sua glória, expressão do seu ser” (Hb 1,3). O mistério do "Pai das Misericórdias" (2Cr 1,3; St 5,11), que concedeu sua piedade a Paulo (1Cr 7.25; 2Cr 4.1; 1Tm 1.13) e cumpriu as promessas todos os crentes (Mt 5,7; ITim 1,2; 2Tim 1,2; Tit 1,4; 2Jn 3).


CONCLUSÃO

Percebe-se que nos escritos bíblicos é proclamada a Misericórdia do Senhor por intermédio de vários eventos e de diferentes formas, assim como são usadas diferentes palavras que expressam a mesma realidade da Misericórdia de Deus. Embora sejam somente palavras humanas, mas tendem a convergir num significado teológico, para expressar o um único conteúdo transcendental, que exprime a riqueza divina da Misericórdia de Deus e, ao mesmo tempo que a revela, a aproxima do homem sob aspectos diversos.


Portanto, a Bíblia encoraja os homens desventurados, sobretudo os que estão oprimidos pelo pecado, assim como todos os homens que têm aderido à Aliança com Deus, a fazerem apelo à Misericórdia e permite-lhes contar com ela. Em seguida, manifesta a necessidade se dar graças e glória a Deus pela Misericórdia, todas as vezes que ela se tenha manifestado e realizado na vida das pessoas.


Assim como na pregação dos Profetas, a Misericórdia significa a especial força do amor, que prevalece sobre o pecado e sobre a infidelidade do povo eleito. Também hoje o homem é chamado a viver a Misericórdia de Deus quando está distante do caminho de Deus, longe do Pai, e, portanto, vive uma vida distorcida de dos valores cristãos, é nesse momento que mais precisa dos cuidados do Pai amoroso e misericordioso que espera com os braços abertos para que o homem volte para a casa paterna junto de Deus.


A Misericórdia divina é a qualidade quase predominante de Deus com relação ao homem; inclui os aspectos de compaixão, ternura, clemência, piedade, paciência, tolerância. A rigor, todo benefício de Deus ao homem tem carácter de Misericórdia, pois não se baseia em direitos ou méritos humanos, mas na própria essência de Deus.


Para o Papa Francisco, a Misericórdia não é uma palavra abstrata, mas um rosto para reconhecer, contemplar e servir. E assim o manifesta na Bula da Misericórdia com que convoca o Jubileu: “Jesus de Nazaré com a Sua palavra, com os seus gestos e com toda a Sua pessoa revela a Misericórdia de Deus. N’Ele não há nada em que falte compaixão”. O Papa anima todos os cristãos a serem misericordiosos uns com os outros porque “a Misericórdia é a chave que sustenta a vida da Igreja”. Pois Jesus em “Sua Pessoa não é outra coisa senão Amor, um amor que se doa e oferece gratuitamente. Os sinais que realiza, sobretudo para com os pecadores, para com as pessoas pobres, excluídas, doentes e em sofrimento, levam consigo o distintivo da Misericórdia”.


Bibliografia Consultada

1 – A Bíblia do Peregrino.

2 – Chave Bíblica.

3 – Harris, R. Laird, Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento.

4 – Smith, Ralph L., Teologia do Antigo Testamento.

5 – Gonzáles, Justo L. Diccinario Manual Teológico,

6 – Martín A. (1969) Teología de la Esperanza, Respuesta a la Angustia Existencia.

7 – Comentario al Nuevo Testamento, William Barclay. 1999 por CLIE para la versión española. Publicado originalmente en 1970 y actualizado en 1991 por The Saint Andrew Press, Escocia.


Elías Nova Nova

Diplomado em Teologia – Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia – FAJE | Belo Horizonte, Brasil (2002)

Licenciatura Plena em Filosofia e Letras – Universidade de Santo Tomás de Aquino | Bogotá, Colômbia (1996)

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